- Renata Abreu
Um homem ejacula em uma passageira dentro de um ônibus, mas é liberado porque o juiz não considerou que havia elementos para enquadrar o sujeito no crime de estupro por não ter havido violência. Uma menina de 12 anos, estuprada há anos pelo namorado da tia, é chamada de ‘assassina’ ao se submeter a um aborto legal. Um ídolo de futebol contesta a acusação de estupro alegando que a vítima estava bêbada e não ofereceu resistência. E agora, uma jovem é dopada com ‘Boa Noite, Cinderela’, violentada e a Justiça absolve o réu por entender que houve um ‘estupro sem a intenção de estuprar’.
Quem país é esse, gente? É tão surreal quanto difícil imaginar que fatos como estes ocorram diariamente, colocando as mulheres em situações cada vez mais difíceis. Não tem sido fácil ser mulher por aqui, onde a cada 7 minutos uma de nós é vítima de estupro. Não é esse Brasil que quero para nós e para os nossos filhos. A cada dia fico mais triste em ver no que o nosso Brasil está se transformando, normalizando os absurdos.
O nosso dia a dia, independente da classe social, é cercado de cuidados e precauções, que vão da maneira de se vestir, de se portar, do que dizer e como dizer que, mal interpretados ou com segundas intenções, podem colocar nossas vidas em risco.
Por que ao avistar um grupo de homens ali na frente temos de mudar o caminho? Por que não podemos baixar a guarda no transporte público? Por que não podemos nos divertir numa festa sem receio de ser dopada e violentada? Por que temos de viver num estado permanente de alerta e medo em que descuidos podem significar perigo? Ser mulher não pode ser sinônimo de perigo constante! Diante de homens assim, as mulheres estão em perigo. Os homens têm que ser educados a respeitar as mulheres e a aprender o que é consentimento. Não é não! Sempre!
Agora, quando as mulheres se enchem de coragem, enfrentando o trauma emocional pela violência sexual sofrida, o sentimento de culpa que aniquila 10 a cada 10 vítimas de estupro (mesmo sem ter culpa de nada), a vergonha e o constrangimento de relatar várias vezes o que houve e decidem denunciar o crime, são humilhadas e massacradas por comentários depreciativos e ofensivos.
O julgamento da jovem Mariana Ferrer foi um show de horrores, creio que jamais visto na história do Judiciário brasileiro. Estupro culposo nivela o Brasil a países que toleram a violência sexual, legitimam a injustiça e responsabilizam a vítima por esse crime abominável.
É muito triste saber que esse tipo de comportamento, que ainda subsiste em parte da sociedade, tenha chegado no tribunal de Justiça. Diante do que assistimos estarrecidos e enojados, que mulher irá denunciar um estupro a partir de agora?
Uma Nação grandiosa como a nossa precisa garantir às mulheres uma vida sem violência. A Justiça precisa ser implacável na defesa dos direitos delas. O erro cometido no julgamento em Santa Catarina precisa urgentemente ser corrigido pelas instâncias superiores do Poder Judiciário para que as vítimas dessa violência se sintam seguras para denunciar seu estuprador.
Minha vontade é abraçar Mariana e todas as vítimas desse crime repugnante. Dar a elas meu colo, meu carinho e o apoio que necessitam para que possam sair desse pesadelo e retomarem as suas vidas de cabeça erguida.
- Renata Abreu é presidente nacional do Podemos e deputada federal por São Paulo